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“A única luz que ela via, era elétrica. Acho que foi aí que ela deixou de ser feliz”
Antes de conseguir o intento, mulher que trabalhava salvando vidas, tentou suicídio cinco vezes
Há pouco tempo, Marta (nome fictício) passou pelo pior pesadelo de sua vida. Sua mãe – que atuava na área de saúde, salvando vidas de outras pessoas – decidiu num ato de desespero retirar a sua própria vida.
O assunto é polêmico. Existe muito tabu a respeito do suicídio. Para familiares e pessoas próximas, além do choque, ficam os sentimentos de vergonha, raiva, tristeza profunda, medo da cobrança por não terem percebido o que havia de errado, a própria consciência sobre não ter impedido ou dado mais atenção? Será que tinha algo a ser feito?
Por isto tudo, é muito importante falar sobre o tema, e acabar de uma vez com o tabu que o cerca; o suicídio é uma morte evitável, se estivermos atentos.
Convencida que a experiência poderia auxiliar outras pessoas, Marta aceitou conversar com o i44 News e relatar sua experiência dolorosa.
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A mãe havia se acostumado com o dia-a-dia no hospital. “Era um local fechado e por muito tempo. A única luz que ela via, era a elétrica. Acho que foi aí que ela deixou de ser feliz”.
Além da rotina de atendimento a doentes, havia os plantões madrugada adentro. “Ela não reclamava, mas era um trabalho sem folga, sem sábado, domingo, aniversário de filho ou natal”.
Ainda que a mãe não falasse, a filha percebia que algo não estava certo. “Para quem visse, minha mãe era uma mulher muito forte, prestativa, mas, em casa ela tinha crises nervosas, ficava agressiva e quebrava coisas”.
Síndrome de Burnout
Quando a mãe procurou ajuda, foi diagnosticada com a Síndrome de Burnout, um distúrbio psíquico relacionado ao esgotamento profissional.
A psiquiatra mourãoense Fernanda Marques explica as causas da síndrome. “É detectável em profissões com rotinas extenuantes, ambientes competitivos e em trabalhos com alta demanda emocional, como profissionais da área da saúde ou segurança. Mas, é difícil rotular qual profissão não tem um índice alto de estresse”.
A mãe de Marta passou a tomar remédios controlados e se submeteu a terapia. Mesmo assim, nas contas da filha, a mãe tentou suicídio pelo menos cinco vezes.
“Ela falava que iria tentar. Dizia que uma hora a encontraríamos ‘rodando’. Eu dizia pra ela não me falar aquilo, porque eu sabia que não era uma brincadeira”.
A partir da primeira tentativa, Marta que já estava casada e não vivia mais com a mãe, se aproximou o quanto pode para evitar a solidão.
“É estranho, porque eu sabia que poderia acontecer, que ela poderia atentar contra a vida dela, e ao mesmo tempo não imaginava que aconteceria. Agora, eu percebo que era um pressentimento meu”.
Para a filha, a partir de alguns anos de tratamento, a situação se reverteu. “Ela se sentia melhor e nós víamos isso. Para quem visse, ela estava curada”.
A psiquiatra Fernanda explica que essa situação não é rara. “Essas pessoas vivem um conflito tão grande até optarem pelo suicídio. Quando decidem, se tranquilizam e acabam aparentando uma melhora”.
Depois da tragédia, a filha busca manter-se forte. “Eu sei que eu fiz tudo o que pude pela minha mãe. Agora, só espero que ela esteja na presença de Deus e livre da dor que ela sentia. Eu sei que ela tentou de todas as formas se livrar dessa angústia, mas ela não conseguiu”
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